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Rússia teme novos ataques na fronteira com a Ucrânia após encerrar operação “antiterrorista” no oeste


O presidente russo, Vladimir Putin (à esquerda), durante reunião com o governador de Belgorod, Vyacheslav Gladkov, em 24 de janeiro de 2023. Foto de arquivo.
AP – Mikhail Klimentyev

A operação terminou e o dispositivo “antiterrorista” colocado em prática pelo governo russo em Belgorod, no oeste, na fronteira com a Ucrânia, foi finalizado nesta terça-feira (23). A iniciativa – que entrou em vigor após uma incursão armada lançada a partir do país vizinho – durou pouco mais que 24 horas. O Kremlin expressou sua “preocupação profunda” com o ataque mais grave contra a Rússia desde o início da invasão da Ucrânia.

Segundo o Ministério da Defesa da Rússia, sua artilharia e aviação foram mobilizadas contra mais de 70 combatentes “ucranianos”. Um civil russo morreu e outros 12 ficaram feridos. Nenhuma baixa foi comunicada da parte do exército russo.

As fotos de vários “sabotadores” mortos – como o governo russo se refere aos participantes do ataque – foram divulgadas nesta tarde. Entre eles, há homens já conhecidos das autoridades e outros rastreados há anos, alguns desde 2014. Um deles havia incendiado a sede do partido Rússia Unida, de Vladimir Putin, em Perm, na região do Ural, no centro-oeste. Outro foi condenado em 2018 por “criação de um grupo extremista” e “incitação ao ódio”. Um terceiro homem foi identificado como o proprietário de uma marca de roupas neonazistas – uma forma de alimentar a retórica do Kremlin sobre a necessidade da “operação especial” na Ucrânia.

O governador da região de Belgorod, Viacheslav Gladkov, anunciou a suspensão do regime “antiterrorista” decretado na véspera. A medida é uma ferramenta jurídica que dá poderes ampliados às forças de segurança para realizar operações armadas, efetuar controle de população e realizar evacuações. A medida foi amplamente utilizada na Chechênia entre 1999 e 2009.

“Tempos difíceis na Rússia”

Durante sua coletiva de imprensa diária, o porta-voz do governo russo, Dmitri Peskov, não ignorou as questões relativas ao ataque de segunda-feira, principalmente as que dizem respeito à proteção das fronteiras. “Claro que o que ocorreu ontem suscita uma preocupação profunda. Isso confirma, mais uma vez, que militantes ucranianos continuam suas atividades contra o nosso país. Isso pede muitos esforços da nossa parte. A operação militar na Ucrânia continua para impedir infiltrações similares no futuro”, indicou.

Segundo o site de informações russo Vrestka, alimentado de fora do país, o ataque de segunda-feira suscita uma forte emoção na opinião pública. A palavra “infiltração” é duas vezes mais procurada no Google do que a tomada de Bakhmut, por exemplo.

Em Moscou, cidadãos russos não escondem o medo de novos ataques. “Toda a nação russa está nervosa com a ideia de que [incursões] possam chegar mais longe, na capital inclusive”, declarou Alexander, um engenheiro de 42 anos.

Como ocorreu com o ataque de Bryansk, no oeste da Rússia, em março, de menor gravidade, mas que chocou o país, o presidente russo, que jamais demonstra emoção, falou sobre o incidente nesta terça. Durante uma cerimônia de entrega de condecorações no Kremlin, Putin reconheceu que o país vive “tempos difíceis”. “Esse é um momento particular para a nossa consolidação nacional”, afirmou.

Dos maternais às universidades em Belgorod e arredores, o ensino é realizado à distância desde outubro passado, por razões de segurança. As autoridades locais prolongaram a medida até o final deste ano letivo.

Ataque mais grave desde início da guerra

A incursão de segunda-feira é considerada como a mais grave enfrentada pela Rússia desde o início da invasão da Ucrânia. Combatentes atacaram várias cidades da região de Belgorod, com tiros de artilharia, lança-foguete e drones. Segundo as autoridades locais, muitos moradores fugiram. Nove cidades foram evacuadas e 13 pessoas ficaram feridas. As autoridades russas indicaram também que uma mulher morreu de insuficiência cardíaca durante a retirada dos moradores da localidade de Kozinka.

Moscou acusa a Ucrânia de planejar o ataque, o que Kiev nega. “Não estamos travando nenhuma guerra em territórios estrangeiros”, disse a vice-ministra da Defesa ucraniana, Ganna Maliar, referindo-se a uma “crise interna russa”.

A operação foi reivindicada em um canal do Telegram pela “Legião Liberdade para a Rússia”, um grupo de russos que luta do lado ucraniano e que em outras ocasiões já afirmou ter realizado incursões na mesma região. Seu líder político é o ex-deputado russo Ilia Ponomariov, o único a votar contra a anexação da Crimeia por parte de Moscou em 2014, e que depois se estabeleceu na Ucrânia.

O outro grupo que afirma ter participado da operação é o “Corpo de Voluntários Russos”, o mesmo que assumiu a autoria da incursão em Bryansk em março. A organização é dirigida por Denis Nikitin, uma figura da extrema direita russa que promovia artes marciais na Ucrânia e era dono de uma marca de roupas.

Com informações de Anissa El Jabri, correspondente da RFI em Moscou, e agências

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