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Face desconhecida do carnaval brasileiro, palhaços do “bate-bola” carioca chamam atenção na Europa


Na periferia carioca, os grupos de bate-bolas dão ares de farra ao Carnaval
REUTERS – RICARDO MORAES

Sem musas ou reis Momos em carros alegóricos, o Carnaval na periferia do Rio de Janeiro tem pouco a ver com as imagens do Sambódromo transmitidas em todo o mundo. A brincadeira nessas ruas é simbolizada por outro personagem, o bate-bola, uma mistura de palhaço e personagem de terror. Cobertos das cabeças aos pés, os bate-bolas costumam usar máscaras assustadoras e uma bola de borracha amarrada em um pedaço de pau e desfilam pelas ruas do subúrbio carioca

No pátio de uma escola, Leonardo Torres coloca sua fantasia de bate-bola. Seus cabelos estão pintados na cor rosa fluorescente, assim como suas luvas e sua meia-calça. A fantasia de cores vivas tem tecidos inflados que dão a ele a aparência de um bufão de corte medieval.

O grupo de bate-bolas de que Leonardo participa se chama Bolo Doido, e festeja o Carnaval em Deodoro, bairro periférico da zona oeste do Rio de Janeiro. Os fogos de artifício marcam o início do desfile. São cerca de 50 pessoas fantasiadas neste grupo de bate-bolas.

“Não tem algo coreografado ou uma dança predefinida. Eu, por exemplo, vou sair de mãos dadas com meu filho devagarzinho, olhando os fogos [de artifício], levantando os braços”, conta Leonardo.

Fama de violento

O Carnaval dos bate-bolas, também conhecido como Clóvis, é tradicional no Rio de Janeiro. Em 2012, a Prefeitura declarou os grupos de foliões como Patrimônio Cultural Carioca de Natureza Imaterial.

No entanto, o Carnaval típico do subúrbio carioca sofre preconceito. Muitos vêm os foliões mascarados como arruaceiros e ligam as fantasias a cenas de violência.

O grupo de Deodoro, que desfila há mais de trinta anos, combate essa imagem. “Infelizmente essa é uma marca que carregamos, mas estamos aqui tentando desmistificar essa mensagem. Todo mundo aqui vê que essa é uma brincadeira sadia”, explica Jonas Camiseta, fundador do Bolo Doido.

Entre os participantes da turma, muitas crianças. Em uma rodinha, Enzo e seus amigos, entre 8 e 12 anos, mostram o orgulho de suas fantasias. “A gente está aqui para zoar, a gente não vem aqui para brigar”, diz.

“Eu adoro isso daqui, é difícil de explicar. Gosto de brincar, de sair correndo, tirar um sarro dos outros, brincar com a sombrinha”, confirma seu amigo. Debaixo das máscaras assustadoras, ninguém pode ser reconhecido.

Visibilidade internacional

Mesmo se não é muito conhecido além das fronteiras cariocas, os bate-bolas chamam cada vez mais atenção fora do Brasil. A revista semanal do jornal francês Le Monde publicou em sua edição deste fim de semana uma reportagem de página inteira sobre o tema. Com o título “A face oculta do Carnaval do Rio”, o texto do correspondente local do vespertino apresenta os bate-bolas como “a alma” da festa carioca.

“A cada ano, esses palhaços celestiais, que parecem ter aterrissado em outro planeta, tomam conta das ruas de bairros populares, negros e periféricos”, detalha o jornalista, lembrando que a celebração é desconhecida de muitos brasileiros. “Os bate-bolas estão, no entanto, longe de serem marginais. Acredita-se que existam até 2.000 grupos apenas no Rio, alguns dos quais com dezenas ou mesmo centenas de membros”, contabiliza.

A dimensão espetacular da festa também interessa os especialistas em performances populares no exterior. Durante uma exposição sobre o Carnaval brasileiro organizada em 2022 no Centre National du Costume de Scène (CNCS), o museu de trajes de espetaculo de Moulins, no centro da França, uma sala foi de dedicada aos bate-bolas.

“Era importante para nós mostrar, na medida do possível, todas as facetas do carnaval do Rio de Janeiro, inclusive esse lado popular”, explicou na época à RFI Delphine Pinasa, diretora do CNCS e uma das comissárias da mostra.

Com informações de Sarah Cozzolino, correspondente da RFI no Rio de Janeiro

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